A palavra "liberdade" deveria ser sagrada. No entanto, ela caiu em uma contradição perigosa: tem sido usada para justificar a exploração. Com o apoio de parte da mídia, blogs políticos e governos, o termo virou um escudo para atacar os mais pobres, manter a desigualdade e permitir que o 1% mais rico interfira na vida de todos nós. Como foi que uma ideia tão nobre acabou virando sinônimo de injustiça?
Liberdade para quem?
Em nome dessa suposta liberdade — especialmente a liberdade de não seguir regras (desregulação) —, bancos quebraram a economia mundial. Com a mesma desculpa, cortam-se impostos dos super-ricos, achatam-se salários e aumentam-se as jornadas de trabalho.
Nos EUA, por exemplo, o lobby das seguradoras usa a "liberdade" para impedir que o povo tenha um sistema de saúde público decente. Na prática, o que chamam de liberdade é, muitas vezes, apenas o direito do poderoso de explorar o mais fraco. É uma filosofia que defende o poder de agir sem freios, não importando quem saia machucado. No fundo, parece apenas uma palavra bonita para disfarçar a ganância.
A Confusão dos Conceitos
Por que demoramos tanto para perceber esse truque? Porque confundimos o tipo de briga que estamos travando. O filósofo Isaiah Berlin ajudou a esclarecer isso ao dividir a liberdade em duas:
Liberdade Negativa: É a liberdade de "me deixe em paz". É agir sem interferência externa.
Liberdade Positiva: É a liberdade de "eu posso fazer". É ter poder e recursos para realizar seus objetivos.
Muitos libertários de direita acusam quem defende o meio ambiente ou a justiça social de querer impor uma vontade coletiva forçada (como faziam as antigas tiranias soviéticas usando a "liberdade positiva"). Mas isso é mentira. A verdadeira batalha hoje é um choque entre duas "liberdades negativas".
Onde a minha liberdade termina?
Como o próprio Berlin dizia: "A liberdade do lobo é, muitas vezes, a morte da ovelha". Nenhuma ação é tão privada que não afete ninguém.
Se a liberdade de um empresário ficar rico depende da miséria de seus funcionários, esse sistema é imoral. Por isso, o Estado precisa impor limites. A sua liberdade termina onde a minha começa. É simples assim.
O Exemplo da Árvore e da Fábrica
Um poeta antigo, John Clare, descreveu isso perfeitamente. O dono de uma terra queria cortar uma árvore antiga. Ele dizia que era sua "liberdade" fazer o que quisesse com sua propriedade. Mas, ao fazer isso, ele destruía a liberdade do poeta e da comunidade de desfrutar daquela sombra e beleza. Sem uma lei que protegesse a árvore, a liberdade do rico esmagou a alegria do pobre.
Hoje, os "defensores da liberdade" ignoram esse conflito. Eles querem a liberdade de poluir, de explorar e até de andar armados, como se fossem direitos sagrados, e chamam qualquer regra de "tirania".
Vamos a um exemplo prático: na Romênia, uma fábrica de chumbo reivindica sua liberdade de produzir (e poluir), enquanto isso encurta a vida dos vizinhos. O correto é regular a fábrica para garantir a liberdade dos vizinhos de não serem envenenados.
A Máscara Caiu
O "libertarianismo" moderno, muitas vezes, é apenas um disfarce para quem quer explorar sem ser incomodado. Eles gritam que o Estado é o inimigo da liberdade, mas escondem que bancos e grandes corporações também tiram nossa liberdade o tempo todo.
Eles negam que precisamos de leis para proteger os vulneráveis. Essa visão deturpada é um truque de mágica: eles usam a palavra "liberdade" como arma para combater a justiça. No fim das contas, transformaram a liberdade em um instrumento de opressão.

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