O Brasil vive um descompasso crônico: uma nação de potencial continental acorrentada a um Poder Legislativo que insiste em operar na mediocridade moral. Não se trata apenas de falhas no presidencialismo de coalizão ou de heranças coloniais; o problema central é a crise de capital humano. Faltam quadros com estatura republicana nas cadeiras acolchoadas de Brasília.
Nas últimas duas décadas e meia, o Parlamento brasileiro sofreu uma metamorfose deletéria. O debate de ideias cedeu lugar a um pragmatismo vulgar, onde o interesse público tornou-se mero acessório retórico. A institucionalização do fisiologismo, via emendas com baixa transparência, transformou o orçamento da União em moeda de troca paroquial, drenando recursos estratégicos para atender a caprichos locais sem critério técnico.
A nostalgia é inevitável quando se compara o cenário atual com tempos idos. Figuras como Ulysses Guimarães ou Ibsen Pinheiro, a despeito de suas contradições, mantinham o decoro e a liturgia do cargo. Hoje, salvo uma minoria resistente — encontrada majoritariamente na esquerda e em ilhas isoladas de lucidez noutras legendas —, o que se vê é a celebração da esperteza em detrimento da ética.
A linhagem de poder na Câmara dos Deputados ilustra essa degradação. Passamos pelo cinismo tático de Eduardo Cunha e pelo "coronelismo orçamentário" de Arthur Lira. Lira, embora tenha deixado a presidência da Casa, mantém sua influência tentacular, agora sob uma nova roupagem.
A ascensão de Hugo Motta ao comando da Câmara simboliza um novo e perigoso capítulo: o da inanição deliberada. Se sobre Motta não pesam, por ora, os indícios de ilicitude que marcaram seus antecessores, pesa algo talvez tão danoso para a instituição: a falta de pulso. Sua gestão desenha-se marcada pela indecisão e por uma permeabilidade excessiva às pressões do "baixo clero". Ao mostrar-se incapaz de impor limites, o atual presidente torna-se refém da ala mais fisiológica do Parlamento, permitindo que a "malandragem" dite o ritmo da pauta nacional.
No Senado, a figura de Davi Alcolumbre reforça o domínio de interesses regionais e privados sobre o coletivo. Somado a isso, temos um grupo autoproclamado conservador que, sob a bandeira da moralidade, ataca as instituições enquanto negocia exceções nos bastidores.
O resultado é um Legislativo que legisla mal, mas que ambiciona governar o Executivo e tutelar o Judiciário. O Brasil assiste a uma "república de estudantes" sem limites, brincando não com mesada, mas com o orçamento federal. Enquanto a sociedade não cobrar a fatura nas urnas, a democracia continuará sendo, como alertava Paulo Freire, um teatro onde o povo assiste passivamente à comédia dos espertos.

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